08/08/2015 às 15h57min - Atualizada em 08/08/2015 às 15h57min

Bruna Karyne

Escritora

Thiago Santos

 Thiago Santos: Quem é Bruna Karyne?

 Bruna Karyne: Meu Deus, eu poderia escrever uma redação com esse tema (risos)! Ela tinha que ser logo a primeira? Sem dúvida, é a pergunta mais difícil. Eu poderia listar algumas qualidades e defeitos que chegassem perto de me definir, mas acho que toda definição é incompleta. Sempre há muito mais nas coisas do que pensamos - e o mesmo vale para nós. Ao mesmo tempo em que descobrimos coisas novas sobre quem somos e quem realmente queremos ser, mudamos. É como se o nosso pensamento estivesse condenado a ficar um passo atrás da alma, ingenuamente tentando decifrá-la e montar o quebra-cabeça quando as peças continuam mudando - o que pode ser tanto angustiante, quanto empolgante, dependendo do ponto de vista. Para mim, é mágico. Lemos e escrevemos histórias sobre os outros, muitas vezes, sem nos dar conta de como a nossa própria história é rica, densa e complexa. Cada pessoa é um universo e é saber disso que me faz querer escrever. Escrever é sonhar, imaginar, perder-se dentro do seu próprio mundo e das suas fantasias, mas também olhar para fora, ver a vida, contribuir para ela. Os personagens que você ‘cria’ são, na verdade, a mágica junção de pedaços seus e do mundo ao redor e, justamente por isso, podem tocar as pessoas e gerar a identificação que geram. Uma grande parte de mim, senão a maior, é a escrita, por isso que fiz questão de mencioná-la nessa resposta.

 Talvez, na realidade, como só faço sonhar, e escrever é sonhar, eu seja, mais do que tudo e do fundo do meu coração, uma escritora. É essa palavra, esse modo de vida, esse estado de espírito que chegam mais perto de me definir.

 

 Quando começou sua paixão pela literatura?

 Mais por histórias do que por literatura propriamente dita. Tudo começou com novelas, na verdade. Novelas e Barbies (risos). Desde que me entendo por gente, minha avó assiste a várias novelas e grande parte da minha infância consistiu em dividir e discutir todas aquelas histórias com ela, mesmo quando não as entendia plenamente. Aliás, antes de escrever livros, meu plano era escrever novelas do horário nobre! Eu tinha ficha de personagens, elenco e trilha sonora; serviço completo! Tenho a minha avó a agradecer por isso; foi ela que despertou esse amor avassalador por ouvir e contar histórias. Tenho certeza de que não seria quem sou hoje não fossem as novelas e os inúmeros filmes que passávamos a tarde inteira assistindo. Falei das Barbies agora há pouco porque era com elas que eu treinava, na falta de atrizes reais (risos).

 No fundo, eu só direcionei a imaginação fértil e essa vontade de contar e relatar histórias, reais ou inventadas, para os livros. Quer dizer, não era apaixonada por eles e então decidi escrevê-los. Era - e sou - apaixonada pela vida e pela verdade que fluem nas incontáveis histórias que ignoramos ou deixamos de criar, por qualquer motivo que seja. Por isso, faço faculdade de cinema. Seja através de filmes, poemas, romances, quadros ou livros, para mim, o importante é contar.

 

 Foi ainda adolescente que começou a escrever suas primeiras histórias?

 Sim. Escrevia tramas de novela em um caderno antigo quando comecei a usá-lo para contos também. Isso foi por volta do 9°ano, quando passei a ter contato com textos de Clarice Lispector, minha maior inspiração, e Lygia Fagundes Telles. Eles me ganharam imediatamente. Líamos muitas antologias na escola e foi em algum momento dessa época que eu me dei conta de que podia me aventurar a escrever contos também, além de poesia. Eram leituras tão rápidas, mas tão cheias de significado, de sentimento, de conteúdo! Cada palavra tinha um sentido escondido e desvendá-los, quer dizer, interpretá-los, era a melhor parte da aula. Ainda hoje, releio-os e sinto o mesmo encanto, o encanto que me fez descobrir e amar a literatura e, em especial, os contos.

 Quando já tinha uma quantidade razoável de textos, minha mãe sugeriu, sem muita fé, que eu lançasse um livro. Como as pessoas, já naquela época, gostavam deles e me apoiavam, levei a sério. Estabeleci uma quantidade - baseando-me no número de contos que as antologias que eu lia tinham -, escrevi e aqui estamos nós.

 

 Quando se deu conta de que a escrita não era só um hobby?

 Quando recebi os 1000 exemplares do meu livro em casa (risos). Depois de passar muito tempo encarando aquelas caixas, vendo o meu sonho empacotado na minha varanda, eu entendi que não dava para simplesmente não fazer nada. Eu teria que lutar pelo meu livro e mergulhar de cabeça no universo literário, mesmo sem saber por onde começar ou o que fazer. Foi um choque de realidade brutal. Eu achava que meu trabalho era só escrever o livro e, depois, colher os frutos: passar por uma livraria e encontrá-lo na estante ou sentar em um parque e ter o prazer de ver alguém lendo-o. Mas a questão é que ninguém sabia do meu livro e a editora não se encarregaria da distribuição, então se eu quisesse torná-lo meramente conhecido, eu mesma teria que colocar a mão na massa, e sem garantia de resultado nenhum. Eu não fazia ideia do que fazer nem como fazer e isso fazia com que eu me sentisse frustrada e impotente. O meu sonho estava ali, bem na minha frente, mas na forma de caixas e caixas que gritavam que aquilo não estava certo e exigiam alguma atitude de mim, qualquer que fosse. Foi nesse momento que eu percebi que não dava para levar a escrita só como um “hobby”, não havia mais espaço para displicência - eu já tinha colocado um filho no mundo (risos). E queria ter muitos outros, logo, minha única opção era seguir em frente. Me acalmar e seguir em frente, mesmo assombrada por tantos medos e inseguranças. Desde que eu fiz essa escolha, minha vida mudou bastante, e eu não me arrependo. Conheci escritores, blogueiros, leitores; fiz várias amizades e, finalmente, entendi que é, sim, possível ser escritor no Brasil. Se não tivesse me arriscado, nunca teria descoberto esse mundo incrível de quem respira literatura e se dedica a ela 24h por dia. Como diz um querido professor de faculdade, “o caminho se faz ao caminhar”. Quer dizer, não tem problema a gente não saber das coisas no início, desde que isso não nos impeça de andar. Talvez a graça seja mesmo ir descobrindo o caminho e as surpresas que ele nos reserva.

 

 Como foi o processo de produção e lançamento de “11 contos e 1 fábula”?

 Foi tudo bem enrolado. Como eu ainda estava no início do Ensino Médio quando decidi lançar “11 contos e 1 fábula”, não tinha tempo de me dedicar direito ao meu próprio livro. Sempre havia um trabalho de grupo, uma semana de provas ou um seminário para desviar a minha atenção. E, já no 3° ano, o temido vestibular. Já pensou como é ter que escrever e organizar um livro com a sombra do ENEM? É terrível (risos)! Isso tudo atrasou muito o processo.

 Além disso, eu sou muito perfeccionista. Mesmo sem tempo, revisei o livro não sei quantas vezes. Eu mandava as provas de volta para a editora por causa de vírgulas que estavam fora do lugar. Contratei até uma professora particular de português para conferir se estava tudo certinho e sanar as dúvidas que eu não consegui tirar na Internet - tudo isso depois de ele já ter passado pela revisão da editora. Outro ponto, que só enrolava os outros dois, era que eu sempre achava que podia melhorar meus textos. Incluía parágrafos e reescrevia frases a cada prova que a editora me mandava. Eu mudava MUITA coisa mesmo. E depois mudava de novo. Ou seja, a produção foi uma loucura.

 Em uma quarta-feira de Julho, enquanto eu estava na escola, os livros simplesmente chegaram a minha casa e a minha mãe me ligou para avisar. Ela disse que eram tantas caixas no elevador que ela ficou com medo de ele cair (risos). A notícia ruim é que, por ser Julho e eu achar que não teria público, não fiz uma noite de autógrafos. E não fiz até agora. A notícia boa é que vou fazer na Bienal! Estarei lá, vendendo, autografando e distribuindo marcadores e outras surpresas - e todos que quiserem são bem-vindos! Podem me acompanhar pelo Facebook: facebook.com/bkaryne

 

 Por que ler um livro de contos e não uma história só?

 Porque um livro de contos te dá a chance de embarcar em várias histórias únicas de uma só vez. Nele, você não fica “preso” a uma só trama ou personagem principal, você navega por um universo dinâmico de mundos paralelos riquíssimos. Não há monopólio; há diversidade, fluidez, movimento, troca. São mil e uma histórias em um livro só - é como um banquete (risos)!

 As pessoas tendem a achar que não dá para criar empatia com os personagens, porque os contos não se aprofundam muito. Isso é um grave engano: brevidade não é sinônimo de superficialidade, muito pelo contrário. É justamente a ‘brevidade’ dos contos que os tornam tão poderosos: eles precisam te conquistar em poucas páginas, por isso, serão intensos, profundos e viciantes. Não é raro eles deixarem gostinho de “quero mais”. E isso não porque foram rasos ou incompletos, mas porque contaram uma história tão boa que não dá para evitar querer mais.

 Além disso, há a questão óbvia do tempo: contos são uma leitura rápida e envolvente. Eles fluem facilmente e, se você não gostar de um, pode simplesmente passar para o próximo. Se as pessoas se dessem a chance de ler um livro de contos, não conseguiriam mais viver sem!

 

 Baseado nisso, o que o leitor pode esperar da leitura de “11 Contos e 1 Fábula“?

 Uma avalanche de sentimentos e muitas reflexões. Eu escrevi esse livro justamente para provocar os leitores e fazê-los pensar sobre determinados temas - amor, perda, amizade, morte, conformismo - a partir de um ângulo diferente. O que salta de cada texto são os sentimentos de cada personagem. Faço questão de mergulhar na mente e, principalmente, no coração de cada um deles e investigar, revirar tudo. Por isso, digo que a minha escrita é bem psicológica. Os fatos importam somente na medida em que impactam os personagens e que os transformam para vida. É o que sentimos que nos torna quem somos; por isso, focar na intensidade e nas contradições dos sentimentos que ora nos impulsionam, ora nos corroem é a chave do meu ‘estilo’.

 Podem esperar também muita diversidade. Geralmente, antologias têm uma tema central, o que pode acabar deixando-as repetitivas e monótonas; ’11 contos’, não. Cada texto conta uma história totalmente independente e que foca em sentimentos diferentes também, já que o meu objetivo era explorá-los ao máximo.

 

 Qual frase descreveria com maior exatidão o seu livro?

 ‘Sinta, viva’.

 

 Baseado em sua experiência como autora: o que a prática da escrita acrescenta ao viver?

 Nossa, tanta coisa! Escrever é uma forma pessoal de se expressar, relaxar, desabafar e comunicar. É uma forma de chegar ao outro, de atingi-lo, de falar com ele a partir de algo seu. A grande mágica da escrita, para mim, é a ilusão de estarmos escrevendo sobre outros, para outros, quando, na verdade, são pedacinhos de nós mesmos que escapam pelas nossas próprias palavras. Escrever é se traduzir, se desnudar, se conhecer, se curar; é transcrever partes da sua alma que você nem imaginava. Quem escreve, transborda e deixa cair na folha de papel respingos do mar que carrega dentro de si. As palavras são pistas, rastros que formam uma colcha de retalhos da alma insondável de cada um de nós. Até hoje me surpreendo e me encanto quando leio meus textos e descubro mais e mais semelhanças com meus personagens. Escrever é se descobrir, é entrar em contato íntimo consigo mesmo. Por isso, acho que todos deveriam fazê-lo. Escrevam cartas, diários, livros, poemas, mas escrevam. Transbordem. É terapia.

 E a melhor parte é que você ainda pode descobrir que há diversas outras pessoas que se sentem como você, que te entendem. Escrever, no fim das contas, é uma forma de não estar sozinho.

 

 Na sua opinião, qual é a maior dificuldade que os autores nacionais precisam enfrentar?

 Definitivamente, divulgação. Apesar de isso estar mudando, ainda há pouco espaço para o autor nacional no mercado editorial. O foco é nos internacionais, basta ir a qualquer livraria para comprovar isso: os livros estrangeiros abarrotam as estantes e as seções de destaque, enquanto os nacionais ficam, salvo exceções, aglomerados em uma seção relativamente escondida chamada “Literatura Nacional”. Acho que muito disso se deve, infelizmente, ao preconceito absurdo que parte dos brasileiros têm em relação à própria literatura. Já ouvi escritores falarem que, quando foram apresentar seus livros na Bienal (lugar mágico para os verdadeiros amantes de livros) e oferecer marcadores, ouviram de imediato “Nem tente, não leio livro nacional”. O lema devia ser “Não julgue um livro pela capa nem pela nacionalidade do autor”. Não consigo entender tanto desmerecimento com a própria cultura, mas posso afirmar que aqui também se produz literatura de qualidade e, a cada dia que passa, os autores nacionais provam isso, escrevendo e batalhando pelo próprio espaço.

 

 Mizpah?

 ‘Mizpah’ é uma palavra que vem do hebraico bíblico e significa “o profundo laço emocional que une pessoas separadas por uma grande distância ou pela morte”. Descobri essa palavra em um site que reúne as palavras intraduzíveis de cada língua e, desde então, ela me marcou muito. Mal sabia eu, naquela época, que ela ia se tornar o título do meu próximo livro!

 Eu nunca tinha escrito um romance - só contos, crônicas e poemas - e também não usava muito o Wattpad, então, disposta a encarar o desafio, decidi unir o útil ao agradável e fazer logo as duas coisas: me aventurar a escrever o meu próprio romance e postar um capítulo novo todo fim de semana. Isso exige um comprometimento absurdo, porque, independente de a história estar pronta ou não - e de você ter tempo -, o capítulo novo precisa estar disponível na próxima semana, há leitores contando com isso. O desafio tem sido incrível e a troca com os leitores também: o meu processo de criação se tornou muito menos solitário, porque, a cada linha que escrevo, me animo imaginando a reação de um leitor específico.

 Mizpah é uma história que fala, principalmente, sobre todas as coisas que não sabemos que sentimos. Quer dizer, será que a gente realmente sabe quem ama, quem odeia, de quem sente saudades? Será que, na confusão dos sentimentos que escondemos, reprimimos, disfarçamos ou exageramos cotidianamente, não acabamos nos perdendo? E se amamos alguém muito mais do que podemos imaginar, mas só descobrimos quando essa pessoa já está morta? Ainda vale a pena admitir amá-la? Ou será que é melhor fingir que tudo é como antes?

 É esse o dilema que a protagonista de Mizpah, Mia - uma adolescente depressiva que acabou de perder a mãe, com quem tinha uma relação tão conturbada quanto visceral - enfrenta. Para mim, é uma história de auto descobrimento, perdão e, sobretudo, amor.

 Segue aqui o link para a história, que está sendo disponibilizada de forma gratuita online:

https://www.wattpad.com/story/38819875

 

 Quais são os seus projetos atuais e futuros? E a Bienal?

 Ah, a Bienal! Nunca participei como autora de uma, então estou muito ansiosa. Estarei no estande da Ler Editorial, no pavilhão azul, autografando “11 contos” em 4 dias - e, nos outros dias, também estarei pelo estande. O livro que comecei a escrever com 13 anos, o meu sonho de criança, não só se tornou realidade, como chegou à Bienal. Coração de escritor não aguenta! É uma satisfação imensa poder participar e ter a oportunidade de conquistar mais leitores. Para o autor, Bienal é uma festa! E é isso que estou esperando (risos)!

 O meu foco também é “Mizpah”, que ainda está no comecinho (10 capítulos), mas promete! E já tenho planos de começar a escrever novas histórias, todas no Wattpad - meus leitores podem esperar folhetins inéditos para o ano que vem! Uma das metas que estabeleci para 2015 foi usar mais essa plataforma e, até agora, tenho gostado bastante do resultado.

 Além disso, vou continuar atuando na divulgação de “11 Contos e 1 Fábula”, fazendo parcerias com blogueiras e participando cada vez mais de eventos literários. Também quero me aventurar a organizá-los e vou começar pelo lançamento oficial de ’11 Contos e 1 Fábula’: tardes de autógrafo estão no calendário! E a primeira delas vai ser na Bienal, uhul!

 Aproveito para deixar aqui o convite (e link no Facebook) para os próximos eventos:

 Dia 15/08, às 14h, estarei em Niterói, comemorando com vários outros autores o aniversário de 1 ano da ‘Sanfer Livros’, a livraria virtual da autora Yohana Sanfer. https://www.facebook.com/events/1630645390513261/

 Dia 18/10, às 13h, vou participar da 2ª edição do LiteraCaxias, evento literário que vai reunir 10 autores nacionais na biblioteca municipal Leonel Brizola, no centro de Duque de Caxias, para falar sobre a carreira e os projetos. https://www.facebook.com/literacaxias?fref=ts

 Vale lembrar que, além do bate-papo com os vários autores e a oportunidade de se apaixonar por novas histórias, sempre rola sorteio de livros, marcadores e brindes nesses eventos, então, fica ligada, galera!

 E, para quem quiser me acompanhar, é só curtir a página no Facebook.

 

 Para finalizar, uma dica para quem quer ser escritor.

 Não desista! E, principalmente, não desista antes mesmo de ter começado! Se escrever é o que você quer fazer pelo resto da vida, se é o que realmente ama, não deixe para lá, não engavete esse sonho. A caminhada é longa e difícil, especialmente no começo, mas vale a pena quando, de repente, pessoas que você nem conhece vão falar com você sobre a sua história; quando você encara suas palavras no Word e tem uma sensação mágica de trabalho bem feito; quando personagens aleatórios começam a falar dentro da sua cabeça e você só consegue pensar no quão reais eles são, antes mesmo de ter escrito uma única linha! Vale a pena quando todo aquele mundo, que era só seu, passa a ser também de várias outras pessoas, que o vivem e amam tanto quanto você.

 Se escrever é o que te faz feliz, nem tenha dúvidas: vale a pena!

 Então, não esmoreça, não desanime, não espere acontecer: escreva, e faça-o com o coração.

 Meus Contatos:

https://www.facebook.com/bkaryne

https://www.wattpad.com/story/38819875

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