29/05/2024 às 11h23min - Atualizada em 29/05/2024 às 20h03min

Iniciativa curitibana luta para diminuir os acidentes envolvendo trens

ONG Trilho Seguro cobra dos órgãos fiscalizadores mais segurança em cruzamentos rodoferroviários

ALINE CAMBUY/ TALK COMUNICAçãO
https://trilhoseguro.org/
Semáforo que deveria estar vermelho enquanto o trem passa, mas permanece verde, aumentando o risco de acidentes em Curitiba. Foto: ONG Trilho Seguro.
Curitiba lidera o índice de acidentes por trem em todo o país, de acordo com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). O relatório divulgado em 2023 aponta que a cidade registrou 154 acidentes em linhas férreas entre 2018 e 2022. Os números mostram ainda que o Paraná é o líder em acidentes de trânsito em casos que envolvem locomotivas. Os dados alarmantes e uma experiência de quase morte motivaram a advogada Julia Marcassa a criar a ONG Trilho Seguro, que tem como principal objetivo cobrar mais segurança nos cruzamentos rodoferroviários.

O consultor de trânsito, Marcelo Araújo, destaca que o tema não é novo. “Em determinadas regiões da cidade de Curitiba, há semáforos que disciplinam tanto o cruzamento de vias terrestres quanto da via férrea, a qual se encontra paralela, portanto, é absolutamente injustificável que o motorista do carro pare seu veículo com o semáforo favorável à sua passagem, ele prevalece. Pior, em Curitiba tem semáforo que não está funcionando de forma a acionar a luz vermelha quando da passagem da composição férrea”, alerta.
O empresário Rubens Mesias, que tem uma empresa no bairro Cajuru há 30 anos, é testemunha do perigo que a sinalização inadequada representa para os motoristas. “Todos os dias vejo o semáforo para veículos abrir, mesmo com o trem passando. Já testemunhei diversos acidentes nesta passagem de nível. Fico me perguntando até quando vamos ver isso acontecer?”, desabafa.

Determinada a mudar essa realidade, ONG Trilho Seguro tem o propósito de impor o cumprimento rigoroso das leis e contribuir para a melhoria da segurança de todos. De acordo com a advogada, a estratégia mais bem-sucedida, evidenciada pelo insucesso de outras numerosas tentativas anteriores de abordar a questão junto à administração municipal e à concessionária ferroviária, consiste em responsabilizar as entidades encarregadas da fiscalização, que, por dever legal, são a ANTT e a Senatran. “Para anular o tradicional jogo de empurra entre o poder público concedente e as empresas concessionárias, a ONG vai cobrar diretamente dos órgãos federais de fiscalização. Iremos exigir providências imediatas e, em caso de descumprimento, a imposição de pesadas multas aos responsáveis”, garante a idealizadora.

A motivação para o projeto teve início depois de uma experiência negativa vivenciada quando Julia voltava para casa em uma tarde chuvosa com o filho João, de apenas dois anos. Enquanto o pequeno cantarolava na cadeirinha, ela dirigia atentamente, respeitando as regras de trânsito. Ao se aproximar de um cruzamento ferroviário no bairro Cajuru, o sinal verde autorizou que ela prosseguisse. No entanto, de repente, Julia se viu à beira de um perigo iminente. Apenas alguns metros à frente, saindo por detrás de um muro, uma enorme locomotiva atravessava a rua em sua direção. “O susto foi imenso. Não tive tempo para pensar, apenas acelerei o carro instintivamente. Se eu tivesse tomado qualquer outra decisão, como frear, por exemplo, o impacto teria sido inevitável”, conta.

Passado o susto, Julia tentou entender o que havia acontecido e decidiu aprofundar sua investigação sobre o incidente. “Fiquei abismada quando soube que muitas outras pessoas já haviam enfrentado o mesmo problema com a falta de segurança nas passagens de nível de Curitiba. Já aconteceu uma quantidade enorme de acidentes com trens, a maioria deles por falta de sinalização. Além disso, existem leis federais que estabelecem a instalação de cancelas e sinaleiros em passagens de nível e que estão sendo completamente negligenciadas”, revela.

Ao fundar a ONG Trilho Seguro, Julia não se tornou apenas uma porta-voz de sua experiência pessoal perigosa, mas também representante de toda uma comunidade enfrentando perigos devido à ausência de sinalização em passagens de nível da capital. “Infelizmente a população, por desconhecer que existem leis que a protegem, está habituada com cruzamentos em que a sinalização está abandonada ou sequer existe. Por este motivo a ONG irá fazer um trabalho de conscientização para esclarecer os cidadãos de que não é apenas uma questão técnica, mas sim um direito de todos, previsto em lei, e que está sendo violado”. No site da organização, há um formulário para que a população possa fazer denúncias e enviar fotos destas perigosas passagens de nível irregulares. Materiais que vão servir para sensibilizar a opinião pública e exigir das autoridades imediatas providências para a solução do problema.

O que diz a legislação brasileira?


A Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997, sancionada pela Presidência da República, em seu Art. 1º § 2º diz claramente que:

 “O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito.”

A Secretaria Nacional de Trânsito (SENATRAN), no uso de suas atribuições definidas no Artigo 19, Inciso XIX, do Código de Trânsito Brasileiro, criou, através do CONTRAN, o MANUAL DE CRUZAMENTOS RODOFERROVIÁRIOS, aprovado pela Resolução CONTRAN nº 857, de 19 de julho de 2021. Nesse manual, são determinados o tipo de periculosidade do cruzamento e as normas que devem ser seguidas para sinalizá-los.

Portanto, a lei determina que o trânsito seguro é um direito, mostra como se deve sinalizar corretamente as passagens de nível e quem deve fiscalizar se isto está sendo cumprido. De acordo com a advogada Julia Marcassa, “em Curitiba fica claro que esta fiscalização não está acontecendo e que os responsáveis pela sinalização não estão agindo”.

Quais os deveres do SENATRAN?

A Secretaria Nacional de Trânsito (SENATRAN) é o órgão máximo executivo de trânsito da União e tem como responsabilidade coordenar o Sistema Nacional de Trânsito (SNT) no Brasil. O Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) é um órgão normativo responsável por estabelecer normas e diretrizes para o trânsito no país. Quando se trata de fiscalização de sinalização de passagens de nível e outras questões relacionadas ao trânsito, a SENATRAN deve ter um papel atuante em conjunto com órgãos estaduais e municipais.

1. Orientação e Fiscalização Técnica: a SENATRAN deve orientar e fiscalizar tecnicamente as ações da prefeitura para garantir a adequação da sinalização de passagens de nível de acordo com as normas do CONTRAN.

2. Avaliação de Conformidade: realizar avaliações para verificar se as sinalizações de passagens de nível estão em conformidade com as normas estabelecidas, assegurando a segurança viária.

Em caso de não cumprimento das normas estabelecidas pelo CONTRAN, a SENATRAN pode adotar diversas medidas, que incluem notificações e advertências, multas, suspensão do repasse de recursos e intervenção nas ações de trânsito do município para corrigir as irregularidades.

Quais os deveres da ANTT?

A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) é responsável por regular e fiscalizar as concessões de infraestrutura de transporte terrestre no Brasil. Quando fiscaliza uma concessionária, a ANTT busca assegurar o cumprimento das cláusulas estabelecidas no contrato de concessão. Alguns dos deveres e instrumentos que a ANTT utiliza para fiscalizar e punir em caso de não cumprimento das cláusulas contratuais incluem:

1. Fiscalização Regular: A ANTT realiza auditorias e inspeções regulares para verificar se a concessionária está cumprindo as obrigações contratuais, que podem incluir aspectos operacionais, de manutenção e de segurança.

2. Sanções Administrativas: Caso a concessionária não cumpra suas obrigações contratuais, a ANTT pode impor sanções administrativas. Essas sanções podem variar de advertências e multas até a aplicação de penalidades mais severas, como a suspensão temporária da concessão.

3. Revisão Contratual: A ANTT pode revisar o contrato de concessão para ajustar as obrigações e condições, se necessário, de acordo com as cláusulas contratuais e a legislação vigente.

4. Rescisão Contratual: Em casos mais graves e persistentes de descumprimento contratual, a ANTT pode rescindir o contrato de concessão, retirando a concessão da empresa infratora e buscando um novo operador para a prestação dos serviços.

"Neste ponto, é importante destacar que o contrato de concessão da Malha Ferroviária Sul, assinado em 27 de fevereiro de 1997, estabelece em sua cláusula 5.2 – DA SEGURANÇA DO SERVIÇO - que: 'A CONCESSIONÁRIA obedecerá às normas de segurança vigentes para a prestação do serviço objeto da concessão'."


Sobre a ONG Trilho Seguro
A Trilho Seguro é uma ONG dedicada à segurança pública, especificamente focada em melhorar a segurança em cruzamentos rodoferroviários. O principal objetivo é garantir que os responsáveis cumpram rigorosamente as leis ao sinalizar estes locais. Mais informações no site https://trilhoseguro.org/  

 

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ALINE OLIVEIRA SANCHO CAMBUY
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