18/01/2024 às 12h36min - Atualizada em 19/01/2024 às 00h02min

A fute-política do Oriente Médio

Futebol como estratégia política no Mundo Árabe

Gianluca Florezano
Al Nassr FC /Divulgação

A Copa do Mundo de 2022 e a Conferência Sobre Mudança Climática das Nações Unidas (COP28), colocaram o Oriente Médio no centro dos holofotes do mundo. Se, por um lado, isso pode ser bom para os negócios árabes; por outro lado, as constantes violações de direitos humanos que ocorrem na região lançam uma sombra sobre a imagem de alguns países perante a comunidade internacional.

Dessa maneira, para se livrar dessa pecha negativa, algumas ditaduras árabes, passaram a investir em políticas de soft power, isto é, políticas para “limpar a sua imagem”. E o principal instrumento para isso foi o esporte, mais precisamente o futebol, prática que ficou conhecida pelo termo britânico sportswashing (a junção das palavras inglesas esporte com lavagem).

Quem deu o primeiro pontapé nessa iniciativa foi os Emirados Árabes Unidos que, em 2008, comprou o Manchester City. O clube inglês, que antes da venda era um time modesto, agora se tornou uma das maiores potências mundiais, inclusive, conquistando a sua primeira Champions League (o principal torneio de mata-mata de clubes do mundo) na temporada de 2022/2023.

O Qatar (ou Catar) também não ficou para trás. Em 2011, a referida nação muçulmana tomou posse da equipe francesa do Paris Saint-Germain (PSG). O time ainda não conseguiu o feito de vencer uma Champions League, porém, seu ataque já contou com a presença de Messi, Neymar e Mbappe - considerado como um dos maiores ataques dos sonhos de qualquer fã de futebol.

Utilizar o esporte como instrumento político, verdade seja dita, não é uma exclusividade das ditaduras árabes e também não é algo recente. Pelo contrário, Mussolini, por exemplo, utilizou a Copa do Mundo de 1934, realizada na Itália, para fazer propaganda de seu regime facista. Hitler, por sua vez, fez a mesma coisa com a Olimpíada de 1936. E a Copa do Mundo de 1978 na Argentina serviu para legitimar a ditadura sangrenta que acontecia no país.

Agora, voltando para o contexto atual, chegou a vez da Arábia Saudita de utilizar o futebol como instrumento político. Em 2021, o país adquiriu o clube inglês do Newcastle e já passou a fazer investimentos significativos no time. Entretanto, a potência árabe deu um passo além e passou a trazer também jogadores de renome internacional ao seu campeonato: Cristiano Ronaldo, Benzema, Neymar e Kanté, são alguns desses atletas.

Esse movimento de trazer esses craques tem como pilares as ideias de retorno financeiro, de melhorar a imagem saudita e de fomentar o futebol local. Porém, também é sobre proteção. Nos últimos anos, a Arábia Saudita tem se aprofundado na política de “abrir as suas portas” ao mundo. Se preparando para o fim do petróleo, a ditadura vem buscando diversificar a sua economia, ampliar suas relações internacionais (inclusive, estava prestes a firmar um acordo com Israel antes da guerra eclodir) e se tornar um polo turístico, nos mesmos moldes que Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.

Isso não significa dizer, no entanto, que a potência árabe vem “suavizando” seu regime autoritário e sangrento. Longe disso, na verdade, o que acontece é que cada vez mais os sauditas necessitam que os olhos do planeta se voltem para eles.

Mas por que? 

Pois, também nos últimos anos, o Irã, da corrente xiita e um dos principais adversários da Arábia Saudita que pertence a corrente sunita, vem intensificando o seu programa nuclear, ou seja, o país persa - por mais que exista uma pressão internacional para que isso não aconteça - pode ter a qualquer momento em mãos a capacidade de produzir uma bomba atômica.

Dessa maneira, com os sauditas ocupando um espaço importante nos holofotes do globo, isso pode, de certo modo, inibir um possível ataque, especialmente atômico, do Irã em seu território. Ou então, caso aconteça alguma ofensiva militar (sem necessariamente ser atômica), a referida nação sunita poderá contar com o apoio e a simpatia de uma parcela considerável da opinião internacional.

Para vermos como a opinião mundial favorável é fundamental em um conflito, basta olharmos para uma outra guerra que está em curso: Rússia x Ucrânia. Sem dúvidas, se não fosse pelo suporte de aliados, os ucranianos já teriam caído diante do poderio militar russo.

Não à toa, agora o atual presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, busca de qualquer forma se manter na mira das câmeras para evitar que os recursos que mantêm seu país de pé não parem de chegar.

Desse modo, mais do que torcedores, quem vibra com o sucesso do campeonato local (sendo transmitido no Brasil pela Band) é a ditadura saudita. Cada jogada, drible e gol de Cristiano Ronaldo, Neymar e Benzema coloca, de certa forma, a imagem da Arábia Saudita no centro do mundo e de uma maneira positiva.

A geopolítica mundial vem se movimento nos últimos tempos e a referida potência árabe já percebeu que o futebol pode ser utilizado como uma poderosa ferramenta de proteção.

Pois, afinal de contas, quem desejaria ver um país com tantos craques em campo ser atacado?


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