08/12/2023 às 13h31min - Atualizada em 09/12/2023 às 08h08min

Atriz e dramaturga Carolina Lira celebra marca de quase mil apresentações de peça pensada para ser encenada via WhatsApp

“Águas que rolam e quenturas” é experimento teatral mergulha na potência do feminino ao longo de múltiplas gerações

Daniel Corrêa
Taylla de Paula

Teatro via WhatsApp? Essa foi uma das ideias que brotaram durante o auge da pandemia e que trouxeram novas possibilidades de renda para atores que se viram, de repente, sem a possibilidade de contar histórias. Foi daí que surgiu “Águas que rolam e quenturas”, um espetáculo idealizado e encenado pela atriz e dramaturga Carolina Lira direto no WhatsApp de quem adquiria o ingresso. O resultado foi uma temporada estendida, que agora chega a quase mil apresentações online do que ela chama de ‘teatro de ouvido’.

A peça explora as complexidades da maternidade, envelhecimento e desafios femininos em uma sociedade patriarcal. Carolina Lira interpreta Maria Júlia, compartilhando, através de mensagens e uma ligação de áudio no WhatsApp, a história de duas mulheres imersas em seus desafios. O cenário, ambientado numa casa durante uma manhã de sol em um país estrangeiro, é imaginado a partir de um texto enviado ao participante. A narrativa aborda as complexidades da relação entre mãe e filha, explorando temas como expectativas frustradas, envelhecimento e os laços afetivos, todos permeados por um persistente desejo de vida contra uma invisibilidade do feminino, um tema que ganhou nova evidência ao ser abordado como tema da redação do ENEM deste ano.

“‘Águas que rolam e quenturas’ conta a história de mulheres. São as mulheres dessa família que se ocupam do trabalho de cuidado. Falar sobre isso é urgente e necessário. Afinal, o trabalho de cuidado sempre sobrecarrega mulheres. É um trabalho invisível que só é notado quando não é feito. O que ninguém vê é o cansaço após jornadas duplas ou triplas. O que ninguém entende é a mulher que deixou de sonhar por causa da maternidade”, conta Carolina.

Este experimento teatral inovador ofereceu uma vivência íntima e personalizada - mesmo que tenha sido à distância. Lira buscou uma forma de contornar a já alta dependência de telas que a sociedade tinha mesmo antes da pandemia.

Crédito: Taylla de Paula

“A ideia de criar o ‘teatro de ouvido’ surgiu num momento crítico em que todos os teatros estavam fechados. Era apenas uma atriz querendo se comunicar com o mundo e querendo dar continuidade ao exercício do seu ofício. Porém, uma artista que se pensa muito como público e não queria oferecer uma experiência em que fosse obrigatório ficar com o rosto grudado na tela. O ‘teatro de ouvido’ permite que os cenários e as personagens sejam criados dentro da imaginação de cada pessoa que participa”, ela entrega.

“Águas que rolam e quenturas” não apenas desafiou as limitações impostas pelo isolamento social, mas também redefiniu a relação entre teatro e audiência. Carolina Lira, além de sua maestria no palco, é uma professora, mestre em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismos, e contribui ativamente para a pesquisa em artes, neurociências e saúde na UFBA.

Por isso essa história ressoa tanto com a autora. Carolina, investida de sua personagem, conduz uma apresentação que mergulha nas nuances do ser mulher. O cenário é pintado nas mentes dos espectadores a partir de textos enviados, enquanto as personagens, Maria, sua mãe e sua filha Serena, compartilham suas visões sobre a vida.

Curiosamente, a interação não termina após o “fechar das cortinas”. “Envio mensagens para a pessoa informando o final da apresentação, mas também convidando-a a mandar uma mensagem de texto, de áudio ou de vídeo, para mim, que estou ali aguardando”, explica Carolina, que chama esse desdobramento de “momento camarim”. “E é sempre surpreendente porque bastante gente liga e aí se inverte a relação, porque há muitas histórias, desde relacionamentos familiares, questões ligadas à criação artística e até amores que não deram certo. Acho que o próprio grau de intimidade, uma ligação telefônica ao invés de um palco de teatro, deixa as pessoas à vontade para se abrirem e o camarim vira o momento em que sou eu quem escuto”, reflete.

Carolina Lira é formada pela Universidade Livre! e ganhou uma crescente intimidade com o seu próprio texto através de mais de 950 performances individuais. Nestas centenas de encenações, ela rompeu as barreiras geográficas, impactando públicos em várias cidades, estados e até países. Os interessados entravam em contato pelo Instagram @quememariajuliaa, enviavam uma mensagem direta e, posteriormente, forneciam seu número de WhatsApp para agendar a sessão. A apresentação, que durava cerca de 40 minutos, foi realizada apenas para um espectador por vez, proporcionando uma conexão única entre a atriz e seu público.

Agora, “Águas que rolam e quenturas” está com um texto completamente redondo e fluido e uma protagonista mais do que integrada à personagem. Por isso, a chegada do espetáculo aos palcos se torna uma espécie de rito de passagem para uma obra construída ao longo de centenas de sessões. Carolina compartilha suas reflexões sobre a experiência, destacando a satisfação em levar o teatro para além das telas, permitindo que as pessoas se envolvam em um espaço mais íntimo. 

“Está sendo um momento muito desafiador e de muito entusiasmo. Estar em contato com o público presencialmente, o teatro de ‘perdigoto’, ali quentinho com o público presente podendo olhar nos olhos das pessoas é uma emoção indescritível”, ela resume, empolgada.

O espetáculo, concebido em tempos desafiadores, continua a emocionar, provocar reflexões e conectar pessoas em um mundo onde a distância física se tornou a norma, mas a arte resiste e reinventa-se. “Águas que Rolam e Quenturas” transcende as fronteiras tradicionais do teatro, proporcionando uma experiência teatral acessível a públicos diversificados. Enquanto a artista prepara novas surpresas e formatos únicos de apresentação, é possível agendar sessões online com Carolina Lira, via Instagram e WhatsApp.

Crédito: Taylla de Paula


 

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