*Dorismeire Vasconcelos
A Amazônia, para nós amazônidas, é mais que a maior floresta tropical do mundo com seus"4,196.943 milhões de km2" de extensão, constituída de 9 países, nutrida e irrigada por águas dos olhos d’aguas, as fontes, igarapé, lagos, rios, afluentes do grande riomar doce” Amazonas” e habitada por uma diversidade de povos originários, comunidades tradicionais, quilombolas, afrodescendentes, campesinos, ribeirinhos, pescadores, populações urbanas, mulheres e juventudes e poliedro cultural. Ela, em seu rosto e corpo feminino de guerreira é nosso solo sagrado, onde se gesta a vida, se conserva os saberes ancestrais e se resiste a violência que se adentra e que impacta nossos corpos e territórios e onde traz a memória revolucionária de resistência e existência ao longo dos séculos. Aqui é a terra banhada pelas águas sagradas e cuidada por encantados em uma conexão com os demais ecossistemas para o equilíbrio da Casa Comum: Nossa Mãe Terra.
Por isso, o dia 5 de setembro, não é apenas uma data comemorativa no calendário ou para lembrar o fato histórico da criação da Província do Amazonas por D. Pedro II em 1850. É um dia de chamar a atenção para esse bioma e tem um objetivo principal que é alertar a população sobre a destruição da floresta e de como podemos ter desenvolvimento sem que seja necessário acabar com essa importante fonte de biodiversidade e que esse desenvolvimento possa ser construído sempre com o “envolvimento” dos povos amazônicos: Nunca uma Amazônia, Sem Nós!!! Assim é para nós amazônidas, o dia da Amazônia é um dia de luta, resistência, consciência, mas também de celebração da vida de tantas Amazônias na AMAZÔNIA: Amazônias Originárias, Amazônia Negras, Amazônia ribeirinhas, Amazônia Camponesas, Amazônias urbanas, Amazônias juventudes, Amazônia Mulheres... com seus desafios, suas lutas, mas também suas conquistas e garantias de direitos e territórios. Nada sobre nós sem nós!
Porque somos, povos da Amazônia, somos das florestânia e da cidadania, vivemos nos rios, nas matas, nos campos e nas cidades. Nascemos, crescemos e gestamos vidas para gerações futuras nesse território sagrado. Sabemos bem o peso , a pressão e a dor das angústias e tristezas, clamores e prantos provindo dos impactos sofridos com a devastação, a queimada, a invasão e grilagem de terras, o cerco, o envenenamento por agrotóxico e pelo mercúrio, o impacto ambiental, social, histórico, culturas, religiosos e psicossocial ocasionado pelos grandes projetos (avanço das monoculturas, hidrelétricas, mineração, obras de infraestrutura que beneficiam grupos econômicos); os riscos sociais, a violência física, moral,, cultural, religiosa, patrimonial e patronal; a destruição causada ao bioma.
Todas essas consequências provem há séculos do interesse econômico, político de grupos econômicos ou pela omissão do Estados e da ausência de políticas públicas de Estado ao território na região, onde muitas vezes entre a razão e a ambição, prevalece “o valor do lucro acima do valor da vida dos povos e territórios”. Quanto vale uma vida na Amazônia?
E sabemos bem que esses ataques contra a Amazônia, não só destroem a Amazônia, mas também o planeta e a humanidade. Há anos cientistas, ativistas socioambientais, líderes políticos e líderes religiosos vem alertando por documentos científicos, religiosos, tratados e pactos nacionais e internacionais a importância de evitar o ponto de não retorno da Amazônia, basta observarmos o dado de desmatamento e queimadas e os dados de rios contaminados por mercúrio, das situações de conflito do campo e invasão de terras indígenas por garimpos na Amazônia Legal, além de “considerar de acordo com dados registrados que a Amazônia está à beira do ponto de não retorno. Uma pequena mudança pode provocar alterações abruptas do ecossistema por mecanismos de retroalimentação. Estamos diante do perigo de um colapso sistêmico na Amazônia, devido aos impactos combinados do desflorestamento, incêndios, contaminações multicausais das águas e dos solos (agroquímicos, narcotráfico, mineração, hidrocarbonetos), que degradam ou destroem ecossistemas amazônicos, as agroindústrias (soja, dendê e outras monoculturas), a bioeconomia baseada em commodities e, em geral, a expansão da fronteira agropecuária que já alcança 15% da Amazônia. A extinção regressiva do Amazonas afetará a nós, povos que lá habitamos, aos países amazônicos e ao mundo como um todo”.
Sabemos que nessa caminhada de luta, resistência e conquistas nos últimos anos, também queremos ao celebrarmos esse dia da Amazônia fazermos algumas ressalvas da longa marcha contra o tempo, para proteger a vida do Planeta e das comunidades frente à emergência climática e à injustiça socioambiental, nessa marcha quantos mártires tombaram: Chico Mendes, Ir Dorothy Stang, Ir Cleusa, Zé Cláudio e Maria do Espirito Santa, Ir Adelaide e tantos anônimos e anônimas que deram suas vidas para defesa da vida dos povos e territórios e, continuamos a resistir e insistir por VIDA.
E atualmente temos a consciência que como “Povos da Amazônia” construímos um consenso forte ao longo dos últimos anos e meses, que levou-nos a abrir na Cúpula dos Presidentes da Amazônia à escuta e à participação da sociedade civil, quando numa construção coletiva sociedade civil e governo a realização dos Diálogos Amazônicos, com a presença e participação de quase 30mil pessoas, em boa parte ligadas a nossas organizações e movimentos populares, povos originários, comunidades tradicionais, quilombolas, mulheres, juventudes, negros... na construção de uma escuta e incidência junto aos mandatários dos países da Pan Amazônia, uma ação inovadíssima na política diplomática de relações exteriores desses países.
Reconhecemos o esforço do governo brasileiro em facilitar estes espaços participativos, mas também, reconhecemos a força de mobilização, articulação e incidência dos povos nos diálogos na realização de uma assembleia dos povos da Terra pela Amazônia para discutir , aprofundar e construir uma agenda comum de cuidado e defesa da Amazônia além cúpula da Amazônia, quando vemos a força da economia agroecológica, da agricultura familiar e florestal, da economia solidária que gera renda, cadeia e modelos produtivos e econômico ecológico de soberania, de segurança alimentar e nutricional e de subsistência a população amazônica e de autodeterminação dos povos amazônicos. Como também o saber científico germinado, construído, produzido e que fluir através de seus centros, campus Universitários públicos e particulares na Amazônia. Assim como a força de luta, resistência dos povos ao marchamos pelas ruas de Belém, cerca de 5mil pessoas, reivindicando que nada se decide na Amazônia sem os amazônidas.
Assim, como não podemos deixar de ressaltar e fazer a memória nesse dia da força de fé e vida impulsionada por tantos missionários/as na Amazônia da Igreja Católica, das diversas denominações cristãs, das diversas religiões, das religiões de matrizes africanas, das cosmovisões indígenas, dos serviços interreligiosos que ao vivenciar seu serviço, diálogo, testemunho de fé anunciam o projeto de Vida de Deus junto aos povos sendo aliados na defesa da vida e na luta pela garantia dos direitos dos povos e territórios.
É por isso que no dia da Amazônia reforçamos, mesmo diante de uma memória em que Gritamos o clamor de nossas angústias e tristezas mas também fazemos ecoar o canto de alegrias e esperanças dessa caminhada de defesa da vida, luta e garantia por direitos, o clamor da terra e dos povos: que são nossas reivindicações, com a radicalidade da urgência deste tempo e as lutas e as causas de todos e todas nós, reforçando a Declaração dos Povos da Terra pela Amazônia:
Os desafios na Amazônia são imensos, mas somos conscientes, como amazônidas que estamos prontos para defender a vida na Amazônia e no planeta e temos a convicção que essas propostas são pequenos caminhos, a curto, médio e longo prazo que se faz necessário, possível de ser semeado, porque é nosso compromisso como guardiãs e guardiões da Amazônia, e se assim o fizermos logo alcançamos o impossível a efetivação da Ecologia Integral do cuidado da Casa Comum: sumak kawsay
“Sonho com uma Amazônia que lute pelos direitos dos mais pobres, dos povos nativos, dos últimos, de modo que sua voz seja escutada e que sua dignidade seja promovida” (Papa Francisco)
*Dorismeire Vasconcelos
É leiga consagrada da Ordem Franciscana Secular, articuladora territorial da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM-Brasil), ativista socioambiental e militante de diversos movimentos sociais e ambientais do Xingu (PA).
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