17/03/2023 às 10h09min - Atualizada em 17/03/2023 às 20h05min

Mulheres na ciência: os desafios que estão além da pesquisa acadêmica

Apesar da paridade de gênero conquistada na América Latina e Caribe, com 46% de mulheres no total de pesquisadores, elas ainda enfrentam obstáculos

SALA DA NOTÍCIA Kasane Comunicação Corporativa
Maria Luisa Arriel (aluna do Colégio Integrado Unidade Jaó, em Goiânia-GO)
O relatório “Uma equação desequilibrada: participação crescente de mulheres em Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática” revelou, em 2022, que a América Latina e Caribe alcançaram a paridade de gênero nas ciências, com as mulheres representando 46% do total de pesquisadores. Contudo, o documento, apresentado pela British Council, em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), também aponta que as mulheres continuam a experimentar barreiras invisíveis, que as impedem de atingir níveis superiores de hierarquia. Por essa razão, o Dia Internacional das Meninas e Mulheres na Ciência, comemorado no dia 11 de fevereiro, surge como uma oportunidade para se discutir tais obstáculos e maneiras de superá-los.

A professora de Ciências Experimentais e Química do Colégio Integrado, Iêda Fonseca, reforça que é muito importante que se tenha, ao menos, um dia para lembrar a toda sociedade dos desafios que as mulheres enfrentam para conquistar um espaço que até hoje ainda é visto e estereotipado como algo dos homens. “Na minha época de formação, no começo dos anos 2000, em Química, na Universidade Federal de Goiás (UFG), já tínhamos um número significativo de mulheres acadêmicas, mas, infelizmente, ainda hoje, não temos as mesmas oportunidades no mercado de trabalho e pouquíssimas estão em sala de aula dividindo frente com os homens”, avalia.

Tal disparidade se agrava nas produções acadêmicas ao redor do mundo, uma vez que as mulheres recebem menos financiamento para pesquisa do que os homens, de acordo com o editorial Science Gender Gap: Are We in the Right Path?. Para Iêda Fonseca, essas discrepâncias ocorrem, principalmente, porque elas enfrentam desafios como conciliar a ciência e a maternidade e provar que seus trabalhos são relevantes da mesma forma que aqueles produzidos por representantes do sexo oposto. “É inadmissível aceitar que mulheres ganhem menos, sejam tratadas como incapazes ou até mesmo sem credibilidade no campo das ciências. Somos tão boas profissionais e estudiosas quanto os homens e temos direito de sermos tratadas de igual maneira”, sublinha a professora.

Histórias que motivam

Iêda Fonseca propõe que, apesar de todas as dificuldades relatadas, é importante acreditar e abrir ainda mais espaço para as mulheres nas ciências. Por essa razão, ela destaca que sempre busca estimular suas alunas a não desistirem de projetos de carreira que envolvem as áreas das ciências, tecnologia, engenharia e matemática. “Sempre mostro documentários, filmes e conto com empolgação sobre a vida de Marie Curie, por exemplo. Grande exemplo de mulher, que revolucionou a ciência com suas descobertas acerca da radioatividade. Gosto muito também de O Show da Luna, animação de uma garota de seis anos que ama ciências e que acredita que a Terra é um enorme laboratório em que ela pode descobrir diversas curiosidades”, relata.

Foi com exemplos assim que Maria Luisa Arriel, de 17 anos, estudante da 3ª série Ensino Médio do Colégio Integrado, conquistou um currículo científico de destaque, mesmo antes de ingressar no curso de Astronomia, que é o seu projeto de carreira. “Ter as primeiras barreiras derrubadas por tantas outras mulheres, facilita muito a minha chegada. Além disso, ter contato com professoras das ciências me motiva ainda mais, porque são pessoas que sabem exatamente o que estamos passando, com quem nos identificamos e é sempre bom ter em quem se espelhar”, analisa. Para ela, ter a coragem e a força de ir atrás e conseguir ultrapassar a barreira da desigualdade é muito significativo para ela e outras meninas, que se sentirão inspiradas e capazes.

A futura pesquisadora já participou da Olimpíada Canguru de Matemática, conquistando uma medalha de bronze, três de prata e uma de ouro; da Olimpíada Nacional de Ciências, com uma honra ao mérito e uma medalha de bronze; da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica, com duas medalhas de ouro; do Torneio Virtual de Química da Universidade de Campinas (Unicamp); da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas e Privadas, com uma honra ao mérito e das Olimpíadas de Matemática do Estado de Goiás e das nacionais de Química e de Física. Maria Luisa chegou ainda às quartas de final no Technovation Girls, competição em grupo que utiliza da tecnologia para resolução de problemas sociais.

Ciência que encanta

A graduanda em Ciências Biológicas e Pedagogia, Juliana Alves Carneiro, de 24 anos, conta que foi durante o Ensino Fundamental que ela decidiu que seria professora de Ciências. Mais tarde, expandiu o horizonte ao decidir que também gostaria de ser bióloga. Hoje, Juliana é estagiária no Laboratório de Ciências do Colégio Externato São José, onde cuida de toda a estrutura do espaço para receber os alunos. “Quando costumamos realizar experiências científicas, eu proponho para as crianças algum experimento, induzo a observação e a formular suas hipóteses em cima daquele ensaio para depois relatar em seus cadernos”, explica. Juliana também conta que tem observado um aumento no interesse das meninas pela área. “Vejo que as meninas têm demonstrado mais interesse na Ciência do que os meninos. Geralmente nos intervalos, algumas me procuram para poder ‘brincar de cientista’ com algum material. Às vezes, elas trazem alguns insetos ou flores que acharam na escola para eu montar o microscópio e elas visualizarem as características do material”, afirma.

Além do Externato, Juliana também participa de uma Liga Acadêmica de Zoologia e Biodiversidade, integra um projeto de extensão que leva insetos para as escolas de Goiânia com o objetivo de mostrar a diversidade para as crianças e ainda trabalha no Laboratório de Genética e Biodiversidade da Universidade Federal de Goiás (UFG). Sobre a disparidade de gênero no meio, ela afirma que existe uma cadeia de fatores.

“Quando uma mulher escolhe seguir a carreira científica e acadêmica, ela vai ter que dividir seu tempo entre assistir as aulas, estudar, escrever artigos e trabalhar fora, pois atualmente os valores das bolsas de graduação, mestrado e doutorado não são suficientes para manter uma casa. E o desafio fica ainda maior quando a mulher entra na maternidade, porque a maioria não consegue apoio familiar e da própria Universidade, sendo assim, acabam abandonando a carreira acadêmica”, conjectura.  Apesar dos desafios, ela conta que incentiva quem deseja seguir carreira. “Torço para que cada vez mais meninas se encantem pela Ciência e possamos mudar esse cenário”, finaliza.

Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Fale pelo Whatsapp
Atendimento
Precisa de ajuda? fale conosco pelo Whatsapp