16/05/2022 às 17h50min - Atualizada em 18/05/2022 às 12h28min

Revolução Poética na Fábrica Literária reuniu mais de 4 mil pessoas

SALA DA NOTÍCIA Verbo Nostro
A segunda edição do festival Revolução Poética, realizado entre 29 de abril e 3 de maio, em Ribeirão Preto, em torno da celebração do Dia da Literatura Brasileira, tanto poetizou temáticas revolucionárias como revolucionou as abordagens da poesia. Realizado pela Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto e Instituto SEB - A Fábrica, o evento retomou o formato presencial, juntamente com transmissão online - ao vivo - de toda a programação, a partir do auditório do espaço A Fábrica, no centro de Ribeirão Preto. Durante os cinco dias de debates, o evento recebeu um público presencial de 460 pessoas, além de mais de 4 mil acessos online, de pessoas de todas as partes do Brasil e 15 países diferentes, como Austrália, Bangladesh, Camboja, Canadá, Egito, Alemanha, Índia, Paquistão, Indonésia, Portugal, Espanha, Reino Unido, Estados Unidos e Vietnã.

No total, 12 rodas de conversa e debates movimentaram a agenda do evento, com presença de 14 convidados especiais - todos autores de referência do universo cultural brasileiro - que colocaram a produção poética em debate através das obras de seis escritores nacionais: Clarice Lispector, Cora Coralina, Carlos Drummond de Andrade, Ferreira Gullar, Manoel de Barros e Paulo Leminski. A partir de um poema de cada autor, foram propostas reflexões sobre sentimentos de incompletude, ausência, completude, amplitude, intensidade e contradição. Paralelamente, autores da nova geração da poesia brasileira promoveram uma fervilhante troca de ideias sobre a literatura nacional da atualidade, a sua representatividade no mercado editorial, as histórias em quadrinhos como narrativas de uma época, e o livro como maneira acessível de lazer e busca de conhecimento.

Logo na abertura, a conversa literária foi com o escritor Jeferson Tenório, autor premiado especialmente pelo romance “O Avesso da Pele” (seu terceiro livro), que levou ao encontro uma abordagem sobre como foi sair da sala de aula para entrar no mundo dos escritores, suas influências na escrita e reflexões sociais que ele aborda em sua obra. “Meu letramento poético veio do rap, minha escrita criativa começou com imitações de textos de autores que eu ia descobrindo e gostando, e me tornei escritor porque fui professor. A escrita impacta o mundo, mas ler é mais importante que escrever”, disse Tenório.

A escritora Lola Salgado também passou pelo palco da Fábrica. O poder da literatura, cultura, histórias e um resgate de sua realidade pessoal foram os assuntos abordados por ela, autora de “A Linguagem do Amor”, “Sol e Júpiter”. Lola também lembrou de um comentário especial que recebeu bem no início de sua produção poética e que funcionou como grande incentivo a seguir escrevendo. “Fiz uma fanfic e mandei para um fórum da banda My Chemical Romance. Me responderam que eu poderia melhorar. Esse foi o meu primeiro conselho na vida como escritora”, pontuou.

A participação da ciberativista e poeta Triscila Oliveira abordou questões como resistência, racismo, preconceito, o poder das redes sociais e sua nova HQ, “Confinada”, em que traça um panorama do confinamento de uma patroa e uma empregada durante a pandemia do coronavírus. “O trabalho doméstico tem cor e gênero. São pessoas que vão morar no trabalho e ficam 24 horas à disposição para servir uma família, sem conviver com a sua própria. Isso é muito colonial’, refletiu.

Com um interessante processo de descoberta da poesia - como leitor e autor -, José Falero levou ao festival um pouco de sua história como servente de pedreiro e supridor de gôndola de supermercado e, depois, como autor reconhecido pelo livro “Os Supridores”, que esteve entre os finalistas do Prêmio Jabuti 2021. “Eu defendo a literatura como um direito humano”, enfatizou Falero, que teve seu primeiro contato com o livro aos 20 anos, incentivado pela irmã. “Conhecer livros e a leitura foi uma revolução em minha vida”, admitiu.

Literatura negra

A produção literária de poetas negros foi um dos destaques do Revolução Poética, com a participação do escritor Stefano Volp e das poetas Mel Duarte e Ryane Leão. Jornalista, roteirista, tradutor e produtor editorial, Stefano Volp é criador da editora Escureceu, voltada à publicação de autores negros clássicos. Autor de “Homens pretos (não) choram”, “Nunca vi a chuva” e “O segredo das larvas”, Volp falou sobre suas obras, experiências profissionais, sentimentos e masculinidade negra. “Não uso narrativa linear, subjetiva ou multi explicativa, mas pretendo trabalhar com a masculinidade negra nos meus livros, sempre optando por histórias de ficção. Para mim, o sonho sempre foi uma forma de fugir da realidade em que vivia e proporcionar uma outra realidade para minha mãe”, contou o escritor.

Além de poeta, Mel Duarte é slammer e produtora cultural, tem cinco livros de poesia publicados e foi enfática ao dizer que “não escrevo para incendiar casas, mas para acender faíscas aos olhos de quem me lê”. Ela também comentou sua formação como escritora, a influência do pai grafiteiro, o desejo de acolher as pessoas com sua escrita, as experimentações poéticas em saraus, o slam como plataforma para sua poesia e as várias personas femininas que a habitam. Mel Duarte é a primeira poeta negra brasileira a lançar um disco de poesia falada, “Mormaço - Entre outras formas de calor”.

A escritora e professora cuiabana Ryane Leão, autora de “Tudo Nela Brilha e Queima” e “Jamais Peço Desculpas Por Me Derramar”, levou muita intensidade ao encontro do Revolução Poética, com generoso compartilhamento sobre sua vida, o encontro com a poesia, a descoberta da produção poética profissional, seus processos criativos, a cura que encontra na literatura e projetos futuros. “Não trilho o caminho da arte pela arte. Sempre tenho um objetivo e escrever profissionalmente é uma conquista”, afirmou Ryane.
      


O Revolução Poética na Fábrica Literária recebeu ainda as autoras Aline Bei, Nina Rizzi e Luiza Romão, e o poeta Marcelino Freire. Formada em Letras e em Artes Cênicas, Aline Bei foi vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura e do Prêmio Toca com o livro “O peso do pássaro morto”, e finalista do Prêmio Rio de Literatura com “Pequena coreografia do adeus”. A autora abordou a interligação entre o palco e a folha em branco, seus dois espaços criativos que, para ela, sempre tiveram algo em comum. “Sinto que a folha em branco é um espaço colaborativo, um lugar de descobrir histórias para serem contadas, de autoanálise, de investigação do próprio corpo e das dores que cada um carrega”, salientou.
   


Nina Rizzi, poeta, tradutora, pesquisadora, editora e professora, criou e realiza laboratórios de escrita criativa com mulheres em todo o Brasil. Luiza Romão, que além de poeta é também atriz, participou do debate sobre completude. Autora dos livros “Sangria”, “Também guardamos pedras aqui” e “Coquetel Motolove”. Luiza destacou que “a gente é palavra que pede encontro”. Com olhar e trabalho voltados às questões femininas, a escritora abordou a presença da mulher na poesia e as outras dimensões possíveis do fazer poético, como guerrilha, resistência, enfrentamento e tradição da oralidade.

O escritor pernambucano Marcelino Freire, autor de "Contos Negreiros" (Prêmio Jabuti 2006), “AcRústico” e “EraOdito”, emocionou ao expor as referências familiares que compõem sua escrita. Falando sobre ausência, Freire conversou sobre a solidão no processo da escrita, do socorro das palavras e das presenças que a ausência traz. “Escrevendo eu compreendo o mundo à minha volta, mas é um momento onde estou muito sozinho. Aí, as palavras me abraçam e me ajudam nessa travessia”, entregou.

A noite de encerramento do festival de ideias Revolução Poética na Fábrica Literária teve a presença da cantora e escritora baiana Assucena, vencedora do Prêmio da Música Brasileira por duas vezes e indicada ao Grammy Latino com As Bahias, sua primeira banda. Na conversa, ela lembrou a mudança para São Paulo como uma espécie de fuga para o anonimato que a cidade grande proporciona e destacou a contradição como único caminho da autocompreensão da sociedade. “Uma das questões da filosofia é a contradição, o jogo entre o sujeito e o objeto. E esse debate será eterno. Por outro lado, a arte tem o papel de romper muros e portões”, disse Assucena.

Oficinas e intervenções

A agenda do evento literário teve ainda oficinas de escrita criativa com Matheus Arcaro e apresentações culturais de música, com Renan Inquérito, DJ Vinícius Preto, rapper João D. Deus e concerto de violas com o maestro José Gustavo Julião de Camargo; de dança, com a Cia Pé na Tábua; de circo, com Brilho Circo Drag; de vídeo, com Matheus Vieira; e intervenção cênica, com Palmira Osunwende.

“A proposta do Revolução Poética é promover esse intercâmbio entre artistas da atualidade e poetas significativos na história da literatura brasileira, convidando o público a uma revolução por meio da poesia. A conexão entre os dois grupos de escritores, que têm suas produções em momentos historicamente tão diferentes, foi muito rica, muito produtiva e muito promissora para novas revoluções”, comenta Adriana Silva, educomunicadora e curadora do evento.

Danilo Barbosa, coordenador do Espaço Cultural da Fábrica e curador da edição de estreia da Fábrica Literária, lembrou que a escolha dos autores convidados priorizou vozes transformadoras. “Todas as escritoras e escritores que participaram do Revolução Poética trouxeram reflexões diante das palavras, em desdobramentos para a multiplicidade de quem somos”, ressaltou. “É nosso papel promover ações que entreguem um mundo melhor para as novas gerações. Neste evento, buscamos isso por meio da literatura”, destacou José Luiz do Carmo, diretor do Instituto SEB.

A presidente da Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto, Dulce Neves, mostra que o evento contou com um público diversificado, que se conectou não só através das redes sociais, mas também pelas redes criadas a partir do desejo de revolucionar suas ideias. “A programação tentou ser democrática e acessível, proporcionando uma série de atividades literárias e culturais em diversas linguagens. O resultado foi um público presente que correspondeu a essa diversidade: jovens, adultos, professores, estudantes e amantes da literatura. “Valorizamos a poesia como linguagem, como exercício de cidadania e como manifestação artística que contribuiu com a formação de leitores conscientes e críticos”, adiantando que, em agosto, a 21ª edição da Feira Internacional do Livro promete ainda mais revoluções, por meio de todos os estilos literários.

Sobre a Fundação do Livro
A Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto é uma entidade de direito privado, sem fins lucrativos. Trata-se de uma evolução da antiga Fundação Feira do Livro, criada em 2004, especialmente para realizar a Feira Nacional do Livro da cidade, hoje considerada a segunda maior feira a céu aberto do país. Em 2020, a Feira tornou-se internacional e em 2021 realizou sua 20ª edição, pela primeira vez, no formato on-line, devido à pandemia do Coronavírus.

Com uma trajetória sólida, projeção nacional e agora internacional, ao longo de seus 20 anos, a entidade ganhou experiência e, atualmente, além da Feira, realiza muitos outros projetos ligados ao universo do livro e da leitura, com calendário de atividades durante todo o ano. A Fundação do Livro e Leitura se mantém com o apoio de mantenedores e patrocinadores, com recursos diretos e advindos das leis de incentivo, em especial do Pronac e do ProAc.

Sobre o Instituto SEB
Ao longo de sua história, o Grupo SEB (Sistema Educacional Brasileiro) tem apoiado projetos ligados ao terceiro setor. Em 2016, criou o Instituto SEB, para reunir e potencializar este trabalho, tendo como sede o espaço A Fábrica, em Ribeirão Preto/SP. As ações do Instituto têm por objetivo engajar pessoas para que se tornem protagonistas do desenvolvimento sustentável de nossa sociedade.

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