27/09/2023 às 15h48min - Atualizada em 28/09/2023 às 00h07min

A disparidade de classes e a problemática da elitização do futebol

Não apenas afeta o presente, mas compromete o futuro do futebol

MP News
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Luis Eduardo Belarmino*

Historicamente, o futebol foi popular entre as camadas populares da sociedade. No Brasil, o esporte é considerado uma paixão nacional, e é praticado por pessoas de todas as classes sociais. No entanto, nas últimas décadas, tem se tornado cada vez mais elitizado, o que tem levado o esporte a perder sua identidade.

Nasceu nas ruas e nos campos de várzea, hoje é um empreendimento lucrativo. Os clubes investem milhões de reais em jogadores, infraestrutura e marketing. A televisão e as empresas de apostas esportivas também contribuem para o aumento dos ganhos do futebol.

Numa nação que reverencia o futebol como uma paixão coletiva, é preocupante ver como a elitização se infiltrou silenciosamente nos fundamentos do esporte mais popular do Brasil. Este é um desafio que transcende o campo e o estádio, atingindo o cerne da nossa sociedade. 

Num tempo não muito distante, os estádios de futebol eram verdadeiros santuários populares, onde pessoas de todas as origens socioeconômicas se reuniam para celebrar sua paixão pelo esporte. Hoje, porém, o custo exorbitante dos ingressos tornou-se uma barreira intransponível para muitos brasileiros, privando-os da emoção visceral de torcer pelo seu time nas arquibancadas.

Esse processo de elitização tem um preço alto. Os ingressos para jogos de futebol estão cada vez mais onerosos, tornando o esporte inacessível para muitos brasileiros. Os clubes também investem cada vez mais em categorias de base, o que dificulta a entrada de novos jogadores de origens populares.

Não apenas afeta o presente, mas compromete o futuro do futebol. Crianças de origens socioeconômicas menos favorecidas são privados de experiências esportivas enriquecedoras e valores fundamentais, como trabalho em equipe e respeito.

Ela não se restringe aos jogos profissionais, ela começa cedo nas categorias de base. A falta de acesso a treinamento de qualidade deixa jovens talentos de famílias de baixa renda em desvantagem, perdendo a oportunidade de desenvolver seu potencial.

Além disso, a autenticidade de apoiar seu time através dos produtos oficiais tornou-se um luxo inatingível para muitos. Camisetas e bonés ostentam etiquetas de preços que excluem a grande parte da população, privando-os da aquisição.

A perda da essência do futebol brasileiro é um fenômeno preocupante. O esporte é um campo que deveria ser um instrumento de inclusão social. No entanto, com a elitização, o futebol brasileiro tem se tornado um esporte que exclui as pessoas de origens populares.

O esporte, que outrora era um campo onde paixão e dedicação reinavam supremos, agora é influenciado pelo dinheiro e investidores. Essa comercialização desmedida ameaça os valores tradicionais do futebol.

A desigualdade geográfica também é uma realidade cruel, com regiões economicamente mais fracas frequentemente relegadas a uma posição secundária em termos de infraestrutura esportiva e desenvolvimento de talentos.

É importante que sejam tomadas medidas para combater a elitização do futebol e preservar sua essência. Como, a adoção de políticas públicas que promovam o acesso ao esporte para as camadas populares; A reforma do sistema de governança do futebol, para torná-lo mais democrático e transparente; O incentivo à prática do futebol nas camadas populares.

Os clubes de elite têm a responsabilidade de liderar pelo exemplo, adotando práticas que promovam a inclusão e a igualdade. Só assim poderemos restaurar a alma do futebol e garantir que ele continue a ser o esporte do povo, sem distinção de classe ou status social. 

Para reverter esse cenário, é crucial adotar medidas concretas, como regulamentações de preços de ingressos, investimento em escolas públicas de futebol e promoção da inclusão de todos os grupos. A participação ativa da comunidade é fundamental para criar um ambiente esportivo verdadeiramente inclusivo. Senão, cada vez mais, ocorrerá a distância entre o vulnerável e seu time de futebol.

Ressalta-se a paixão de um torcedor por seu clube transcende as fronteiras do entendimento comum. É um laço inquebrável, um sentimento profundo que ecoa além dos momentos mais calmos da vida. Mas é nos momentos de estresse, quando a pressão da rotina e as preocupações do mundo parecem sufocantes, que essa paixão se revela em toda a sua glória.

Imagine um torcedor, em uma tarde cinzenta e nublada, com o peso do mundo em seus ombros. As preocupações do trabalho, da família, e as inúmeras responsabilidades da vida adulta ameaçam esmagá-lo. Ele se sente como uma pequena embarcação à deriva em um mar tempestuoso. Mas, em meio a esse caos, há uma âncora que o mantém firme, uma âncora chamada "o jogo do seu time".

À medida que o momento do jogo se aproxima, a tensão dentro desse torcedor começa a diminuir. Seus pensamentos se voltam para o estádio, o campo, as cores vibrantes de seu clube e a promessa de 90 minutos de escape emocional. Ele se veste com as cores de seu time, ergue sua bandeira, e seu coração começa a bater no ritmo dos cânticos da torcida.

O apito inicial é como um grito de liberdade. Naquele instante, todas as preocupações são deixadas de lado. Ele se entrega completamente ao jogo, imerso em uma paixão que transcende o entendimento. A cada passe, a cada chute, a cada defesa, sua alma vibra em sintonia com o time que ama.

Cada gol é uma explosão de emoção, uma catarse que libera todo o estresse acumulado. E mesmo que o resultado seja incerto, mesmo que a vitória não seja garantida, a paixão desse torcedor não vacila. Ele está conectado a algo maior do que ele mesmo, a uma comunidade de pessoas que compartilham a mesma devoção.

Quando o jogo termina, independentemente do resultado, algo incrível acontece. O torcedor sente uma sensação de alívio, como se todo o estresse e a pressão tivessem sido lavados. Ele se sente renovado, pronto para enfrentar os desafios do mundo com uma nova perspectiva.

A paixão de um torcedor por seu clube é mais do que um simples entretenimento. É um refúgio emocional, um vínculo que o ajuda a enfrentar os altos e baixos da vida. É um amor inabalável que transcende o tempo e as adversidades. E, nos momentos de estresse, é a chama que ilumina o caminho, lembrando-o de que, não importa o quão difícil a jornada possa ser, sempre haverá um jogo, um time e uma paixão que o acalmarão e o fortalecerão.

Por isso, no último domingo, dia 17, durante o primeiro jogo da final da Copa do Brasil, uma cena inusitada marcou a vitória do São Paulo sobre o Flamengo. Os torcedores rubro-negros que estavam presentes no Maracanã expressaram sua insatisfação com vaias estridentes assim que a locução do estádio anunciou que a partida havia arrecadado um valor bruto de R$ 26.343.300,00, com a presença de um público de 60.390 torcedores pagantes, estabelecendo um recorde na história do futebol brasileiro.

O anúncio da arrecadação histórica foi acompanhado por uma série de xingamentos e vaias direcionados à diretoria do Flamengo, com especial ênfase no presidente Rodolfo Landim. Durante a semana que antecedeu o jogo, os torcedores flamenguistas demonstraram seu descontentamento em relação aos preços dos ingressos para a final no Rio. Os valores variavam de R$ 400 para a entrada mais acessível a R$ 4.500 para a mais cara. Em contrapartida, no ano anterior, o Flamengo havia estabelecido o preço mínimo de R$ 280 para os ingressos da final da Copa do Brasil, quando conquistou o título ao vencer o Corinthians nos pênaltis e se tornar tetracampeão do torneio.

Por fim, nossa paixão não pode ser refém da elitização, pois o futebol é, e deve continuar sendo, a expressão mais autêntica da alma nacional.

*Luis Eduardo Belarmino é advogado, Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Bauru. Especialista em Direito Desportivo pela Universidade do Minho. Com Aperfeiçoamento em Direito Desportivo pelo Instituto de Direito Contemporâneo. Pós-graduando em Direito Penal e Processo Penal. Membro Efetivo Regional da Comissão Especial do Acadêmico e Acadêmica de Direito da OAB/SP). Diretor Crimes Contra a Ordem Econômica da Comissão Estadual dos Acadêmicos de Direito e Estágio Profissional de São Paulo- CADEP/SP.  Autor da obra “Lavagem de dinheiro no Futebol”. Coautor diversas obras jurídicas.  
 

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