30/01/2020 às 15h40min - Atualizada em 30/01/2020 às 15h40min

Blue Jasmine / SP

Léo Coutinho

Léo Coutinho

Blog do Léo Coutinho

Léo Coutinho
Monica Bergamo é um colosso de repórter. Na coluna de hoje na Folha de S. Paulo trouxe dados sobre o ainda inédito Censo da Prefeitura, que só amanhã terá a íntegra publicada. Insisto: não é pouco inédito. Conversei com membros dos primeiros escalões e ninguém ainda leu os dados todos.

Pelo que a Folha antecipou, o Censo traduz em números o que se vê pelas ruas da cidade. Ah se esta nossa freguesia, o centro expandido, descesse do jipe para um passeiote na calçada... Ou pelo menos baixassem os vidros de vez em quando. Veriam uma cidade absolutamente deprimida.

Vamos aguardar o levantamento completo, mas já dá para dizer que os números espelham a tristeza que está nas ruas: entre 2015 e 2019 a população desabrigada cresceu 60%, de 15,9 mil para 24.344.

Sou pedestre e ando a pé inclusive por lugares e em horários que a maioria das pessoas das minhas relações não recomenda. Aliás, eu também não recomendo, sobretudo em se estando só. Mulher então, nem pensar. E penso que o risco físico é até baixo perto do emocional. Mas eu nasci assim e não sei viver de outro jeito. É como que vital para mim ver de perto como estão as coisas no meu entorno.

A nota que encerra o furo da coluna fala dos motivos que levaram tantos dos nossos concidadãos ao relento: “conflitos familiares, falecimento de parentes, drogas e problemas de saúde (como depressão). Alguns são egressos do sistema prisional.”

Me pegou o “conflitos familiares” em primeiro lugar na nota. Se foi aleatório ou obedece aos números do Censo, nem meus contatos na Prefeitura souberam dizer, nem a coluna pôde antecipar. Aguardemos, pois. Mas tenho um palpite.

Pelas piadas sobre grupos de família no whatsapp e constrangimentos na ceia de Natal entre pessoas que vivem confortavelmente, pode-se imaginar o prejuízo social que o estresse político atual provoca em quem tem um só cômodo para a família toda, muitas das vezes no fundo de um quintal úmido e pouco arejado. Quem pode afirmar que não prefere uma marquise na República do que passar o dia encarando o tio do whatsapp?

Sei de casais que não se reconhecem mais. Marido falava exclusivamente sobre bolsa, golfe, futebol, vinhos, automóveis e viagens. Há alguns anos passou a dar opinião política e a mulher constatou que casou-se e teve filhos com um reaça. Imagina.

Sei de parentes, pais e até mães de mulheres e gays que, sem qualquer pudor, reconhecimento, ou sequer preocupação, aplaudem as declarações tresloucadas sobre costumes das autoridades eleitas. Pior: há cada vez mais gente confortável em censurar crenças, orientação sexual, comportamento de seus entes. Para quem não tem couro muito grosso só pode ser insuportável.

Preciso encerrar mas não sem antes falar de drogas e depressão. Quantos amigos partiram para o oito ou oitenta, abstinência total ou porre emendado? E os psicanalistas e psiquiatras? Nem eles estão aguentando. Pergunte ao seu. Então imagine como seria se esta paróquia não pudesse pagar pelo tratamento. São Paulo seria um Blue Jasmine abissal.

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