15/07/2014 às 10h01min - Atualizada em 15/07/2014 às 10h01min

Amor

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Isabela Gomes

O cenário ? Brotos ainda verdinhos da goiabeira começando a povoar seus galhos. O céu de um doce azul. Tempo morno, como Abril gosta de ser. A grama verde, o sol ameaçando a se pôr. Uma brisa leve faz chacoalhar as folhinhas ainda juntinhas nos galhos.
Assim se fez o dia mais feliz da vida de Iracema. Dois bancos, uma promessa: amor eterno.
- Casa comigo ? – ele diria três dias antes
- Caso! – Iracema responderia.
Ela nunca resistira aos braços do amado. Não seria capaz. Ele faz o sério virar tolo, vê o mundo com olhos de criança. Ninguém entendia. Iracema gostava. O grande dia chegou e apenas as pessoas que realmente queriam a felicidade do casal foram chamadas e apareceram. O pai de Iracema, negro robusto, uma cara séria, um coração mole. O velho Ramires, senhorzinho negro, cego, magro, cheio de histórias para contar e conselhos para dar. Tia Augusta, gorda,sempre com um pano na cabeça e uma risada gostosa. Crianças de toda a vila. Marcelo, homem branco, alto, bravo, sempre sério, mas com muito amor no coração. Carlota, jovem senhora, sempre com vestidos longos, costumes antigos, risada discreta e cabelos louros preso em um coque.
Sentaram-se todos em tocos de madeira. Iracema pegou na mão do amado.
- Vem Léo! Já chegou a hora. - Ela disse.
Sentaram-se um de frente para o outro de mãos dadas. Iracema, com os cabelos soltos e seu vestidinho de pano branco, sorria. Olharam-se, não com um olhar normal. Aquele olhar que vê a alma, que vê as qualidades e adora, que vê os pecados e perdoa.
O sol começava a se pôr, espalhando-se pelo céu outrora azul, agora dourado. O pacto de sangue! Juraram fazer um pacto de sangue para unirem corpo e alma.
- Primeiro você. – Iracema disse – Primeiro fura minha mão e melhor que tente furar a sua também. Há de me faltar força...e coragem.
Léo pegou a mão de Iracema com a destra e segurando a agulha, estava determinado. Era um pequeno furo, não faria estrago, não deixaria marca.
- Pronta?
-Sim – Iracema disse e cerrou os olhos com força. Espremia sua face numa careta, como se já sentisse dor antes da mesma começar. – Vai! Vai, se não desisto!
Léo olhou para a mão dela. Pequena, morena, frágil. Foi com a agulha em cheio.
- Foi ? – Iracema disse
- Não. Precisa de ser mais forte.
- Então faça mais forte!
O futuro marido tentou mais uma, duas, três vezes. Não podia. Como causar dor a uma criaturinha tão frágil?
- Não posso. O sangue pode ser cancelado ? Não posso machucar Iracema.
O velho Ramires tirou o cachimbo da boca e riu.
- Tu há de ser um bom homem. Vejo que aprendeu tudo que te ensinei  já que não machuca uma mulher nem com uma agulha! Cancela a agulha, Iracema!
Tia Augusta se desmanchava em lágrimas no ombro do pai de Iracema.  A agulha foi cancelada. Riram, juraram amor, juraram felicidade. Carlota sorria e enxugava o canto dos olhos.
 Os noivos se levantaram dos tocos de madeira, Léo beijou a testa de Iracema. Abraçaram-se. O pai de Iracema, com a testa franzida, passava as costas da mão sobre os olhos.
Desejaram felicidade aos noivos. Tia Augusta pediu aos deuses que abençoassem os novos pombos. Carlota correu para casa, rezar para Frei Galvão. O velho Ramires e o pai de Iracema foram abraçá-la e fizeram certas ameaças à Léo. Que cuidasse bem dela, que protegesse, que não machucasse. Que a fizesse feliz.
- Deixe os dois! – Tia Augusta bradou, puxando a mão do pai de Iracema. – Vem! Vem que eu passo um cafezinho lá em casa.
Foram-se. Iracema sorriu. Sentou-se ao pé da Goiabeira olhando para o céu, ainda avermelhado. Léo sentou-se ao seu lado. Sorriram. Amaram.

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