22/07/2023 às 16h05min - Atualizada em 20/07/2023 às 16h03min

Genética: Entenda o caso da mãe acusada de matar os filhos que foi inocentada pela ciência

Em uma história que parece ter saído das páginas de um livro de suspense, Kathleen, uma mulher australiana, passou duas décadas atrás das grades, condenada pela morte de seus quatro filhos. No entanto, uma reviravolta científica inesperada mudou completamente o rumo desse caso chocante. Cientistas conseguiram provar que a verdadeira causa das mortes foi uma série de mutações genéticas raras, inocentando Kathleen de todas as acusações.

A trajetória de Kathleen foi marcada por tragédias desde cedo. Após perder a mãe, vítima de um assassinato brutal, ela foi criada em instituições de menores e em famílias adotivas. Em 1987, aos 20 anos, Kathleen se casou e deu à luz seu primeiro filho, Caleb, seguido por Patrick um ano depois. No entanto, a felicidade familiar foi interrompida por tragédias inexplicáveis.

Sarah, a terceira filha de Kathleen, faleceu com apenas dez meses de idade, seguida por Laura, que morreu aos 18 meses. As três primeiras mortes foram inicialmente atribuídas à síndrome da morte súbita infantil, mas a quarta morte levantou suspeitas e colocou Kathleen no centro de uma investigação. Um médico forense marcou a causa da morte como "indeterminada", e promotores afirmaram que era estatisticamente improvável que quatro bebês de uma mesma família morressem tão cedo e sob circunstâncias tão misteriosas.

As acusações contra Kathleen foram reforçadas quando seu então marido, Craig Folbigg, entregou à polícia os diários da esposa, que continham anotações suspeitas. No entanto, Kathleen sempre negou veementemente qualquer envolvimento nas mortes de seus filhos.

Foi somente após 16 anos de prisão que a ciência entrou em cena para mudar o curso dessa história. Carola Vinuesa, uma renomada cientista e diretora da pesquisa, foi abordada por um jovem advogado interessado no caso, que questionou a possibilidade de causas genéticas por trás das mortes das crianças. A tecnologia avançada desde a condenação em 2003 tornou possível investigar essa teoria, e Carola decidiu avançar nas pesquisas.

De acordo com a mestre em genética, Bianca Pizzato, com as amostras de sangue retiradas dos testes do pezinho, Carola descobriu que as duas filhas mulheres de Kathleen, Sarah e Laura, carregavam uma variante até então desconhecida do gene CALM2. “Essa variante afetava a proteína calmodulina, responsável pelo equilíbrio dos níveis de sódio, potássio e cálcio no organismo, desempenhando um papel crucial na saúde cardíaca. As mutações nela podem causar arritmias cardíacas e morte súbita”, explica Bianca.

Carola também encontrou uma variante rara em outro gene, o BSN, nos dois filhos homens de Kathleen, Caleb e Patrick, associado a casos de epilepsia. Essas descobertas lançaram luz sobre a verdadeira causa das mortes e reforçaram a teoria de que as tragédias foram resultado de mutações genéticas raras. Com 27 pesquisadores apoiando as evidências e 150 renomados cientistas, incluindo dois vencedores do Prêmio Nobel, assinando uma petição para a reavaliação do caso, a justiça concluiu que existiam "dúvidas razoáveis" sobre a culpa de Kathleen e que suas crianças podem ter falecido de causas naturais.

Após 20 anos de uma injusta sentença, Kathleen foi finalmente libertada no início de junho, com base nas descobertas genéticas que inocentaram sua culpabilidade. “Essa reviravolta surpreendente destaca a importância da análise genética e do aconselhamento genético em casos de doenças hereditárias, evidenciando como a ciência pode revelar a verdade e trazer justiça a situações complexas e aparentemente insolúveis”, destaca Pizzato.

A história de Kathleen serve como um lembrete impactante de que a verdade pode estar oculta nas entrelinhas do nosso código genético, e que a ciência, quando aliada à busca pela justiça, pode trazer à tona a inocência de quem foi injustamente condenado. “Ainda há muito a ser descoberto e desvendado nos segredos do DNA humano, e cada avanço científico nos aproxima de um mundo mais justo e esclarecido”, finaliza a mestre em genética.

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